quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Aristóteles, o Teatro e a Tragédia

Após a morte de Eurípides, os dramaturgos do século IV foram meros arrivistas bem sucedidos. Os concursos trágicos ou festivais prosseguiram por longo tempo, com uma peça antiga usada para introduzir as novas, mas estas eram comparativamente fracas e a dramaturgia começou a perder a importância. Atores, cenógrafos e diretores tornaram-se mais importantes que os dramaturgos
O século IV foi também à era da crítica, foi o período da inacabada Poética, na qual Aristóteles configurou os princípios da dramaturgia grega tais como os encontrou nas obras de seus contemporâneos e predecessores. Suas lúcidas definições são um marco na história da critica teatral, embora sua influência sobre o teatro europeu, iniciada na Renascença, tenha sido de certo modo nociva, em grande parte por ter sido mal compreendida e tomada literalmente.
 
Aristóteles estabeleceu o princípio de que uma peça teatral é a imitação de uma ação, sublinhou a importância da trama dotada de começo, meio e fim, e deu especial destaque à unidade de ação, ademais, segundo a Poética, o deslindar da trama deve surgir da própria trama: dentro da ação nada deve ser irracional. As personagens devem revelar-se, não apenas pelo que fazem, como também por sua inclinação moral (ethos), e por sua forma de raciocínio (dianóia).
Para o efeito geral da tragédia, Aristóteles desenvolveu a teoria da catarse, segundo a qual a tragédia purifica as emoções através da “piedade” e do “terror”. Tendemos a interpretar essa idéia como um processo terapêutico por meio do qual o espectador se identifica com os sofredores no palco e se livra, assim, de seus próprios demônios.
No século III a.C. o teatro gozou de um período de sucesso em Alexandria sob o esclarecido mecenato de Ptolomeu II que fez de sua biblioteca o repositório da cultura grega. Infelizmente o incêndio dessa biblioteca representa até hoje uma irreparável perda para o mundo cultural. O incêndio da biblioteca de Ptolomeu II deu cabo ao primeiro grande ciclo da dramaturgia mundial.Roma adorou a cultura grega como moda, forneceu cinco respeitáveis dramaturgos durante a República, que chegou ao fim na segunda metade do século I a.C., mas as peças perdidas de Livio Andronico, Névio, Ênio e outros, sabe-se, eram meramente baseadas em Ésquilo, Sófocles e Eurípides. A força imperial romana toma o lugar da harmonia grega e a prosa disfarçada em verso suplanta a poesia.
 
O Conceito de Catarse Aristotélico
 
 
Segundo Aristóteles, a Catarse é o meio através do qual o Homem purifica sua alma, através da representação trágica. Para ele, a tragédia é um estilo derivado da poética dramática, e consiste na reprodução de ações nobres, por intermédio de atores, os quais imitam no palco as desventuras dos heróis trágicos que, por escolhas mal realizadas, passam da felicidade para a infelicidade, provocando na platéia sentimentos de terror e piedade, purgando assim as emoções humanas.
Desta forma, não basta que pessoas boas repentinamente atravessem a ponte que leva da graça para a desgraça, nem que seres maus encontrem a desdita; enfim, qualquer revés da sorte que atingir pessoas comuns não suscitará nas testemunhas destes eventos os sentimentos necessários para desencadear uma descarga emocional. Este mecanismo apenas surte efeito quando os acontecimentos giram em torno de personagens extraordinários que causam, através de suas ações desastrosas, alguma espécie de desmedida, como, por exemplo, Édipo Rei, quando de rei tebano passa a amante da própria mãe, pune-se ao cegar a si próprio e parte para o exílio. Ou seja, quando a desdita ocorre a quem não detém o merecimento.
O nascimento da tragédia está, conforme defende Aristóteles, ligado a práticas religiosas e a rituais realizados em honra de Dionísio, deus do vinho, da embriaguez, da loucura. Os artistas honravam esta divindade através da apresentação dos ditirambos – canto de natureza coral, intenso e apaixonado, composto de uma esfera narrativa, declamada pelo cantor mais importante do grupo, também chamado corifeu, e de uma parte coral, interpretada por personagens caracterizados como faunos e sátiros, conhecidos seguidores de Dionísio -, que são considerados precursores do teatro grego.
Desta forma, a catarse pode ser vista como pacificação e exaustão de forças embriagadoras e insanas que são invocadas pela tragédia, que por sua vez tem em sua raiz justamente esse mecanismo ritualístico herdado dos ditirambos criados para homenagear Dionísio, os quais evoluíram para a modalidade trágica. Com a decadência da literatura greco-romana, a catarse foi herdada por outros estilos poéticos, assumindo novas formas conforme a evolução histórica da poética.

A Tragédia Grega


A tragédia é a imitação de uma ação séria e concluída em si mesma... que, mediante uma série de casos que suscitam piedade e terror, tem por efeito aliviar e purificar a alma de tais paixões.
                                                                                       Aristóteles


                                                                                         

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